02 abril, 2019


[Resenha] Boy Erased: Uma Verdade Anulada - Garrard Conley

Ficha Técnica 

Título: Boy Erased: Uma Verdade Anulada
Título Original: Boy Erased
Autor: Garrard Conley
ISBN: 978-85-510-0411-1
Páginas: 320
Ano: 2019
Tradutor: Carolina Selvatici
Editora: Intrínseca
Em seu elogiado livro de estreia, Garrard Conley revisita as memórias do doloroso período em que participou de um programa de terapia baseado no estudo da Bíblia que prometia “curá-lo” de sua homossexualidade. Filho de um pastor da Igreja Batista e criado em uma cidadezinha conservadora no sul dos Estados Unidos, aos 19 anos Garrard foi convencido pelos próprios pais a apagar uma parte de si. Em uma tentativa desesperada de agradá-los e de não ser expulso do convívio da família, ele quase se destruiu por completo, mas encontrou forças para buscar sua identidade e hoje é ativista contra as terapias de conversão. Tocante e inspiradora, a história do autor é um acerto de contas com o passado, um panorama complexo das relações dele com a família, com a fé e com a comunidade. O livro é o testemunho dos traumas e consequências de se tentar aniquilar parte essencial de um ser humano.

Resenha

“Boy Erased: Uma Verdade Anulada” é uma autobiografia em forma de diário, que relata uma complicada e cruel experiência vivida pelo autor Garrard Conley. Nascido na região sul dos Estados Unidos e filho de um pastor da igreja Batista, Garrard precisou lidar com a condenação tanto religiosa quanto familiar – e obviamente a social também – por ser homossexual, ao ponto de ser enviado para um centro de tratamento para conversão sexual.

Garrard concorda em participar da terapia de “cura”, pois se sente extremamente culpado por algo que ele é, mas que foi ensinado desde sempre a ver como pecado. Após ser violentado na faculdade aos 19 anos e ter sua orientação sexual revelada por seu agressor, Garrard vê nesse grupo, conhecido como Amor em Ação, sua única opção para conseguir ser aceito novamente em seu seio familiar.

Parecia que eu não tinha nada a confessar até aquele momento íntimo no carro. De repente, havia uma nova pressão sobre nós.
P. 52

“Boy Erased” é uma obra com uma temática chocante e difícil de crer que seus eventos aconteceram recentemente, ali no ano de 2004. Apesar do livro alternar entre o passado de Conley e somente ser abordado poucos dias dentro do centro “terapêutico”, fica evidente que a breve experiência do autor dentro dessa instituição foi suficiente para lhe deixar marcas para toda a vida. Não é atoa que atualmente Garrard usa sua voz para condenar tais instituições que continuam exercendo tal tipo de “tratamento” até os dias de hoje.

Se tratando da narrativa em si, o livro peca ao relatar muito pouco dos acontecimentos dentro da instituição, e dar muita ênfase no passado do autor, sem necessariamente estar adicionando fatos importantes para o leitor. A verdade é que Garrard escreve demais, mas nos conta muito pouco. Tal escrita torna o livro arrastado e pobre, apesar de sua temática ser capaz de tantas nuances e possibilidades. Para piorar, os capítulos são extensos demais, alguns deles chegando em torno das 50 páginas.

Quando minha mãe voltou ao quarto, limpando a boca com as costas da mão, meus pais se sentaram na beirada da cama e explicaram que encontrariam uma maneira de me curar.
P. 154

Outro ponto negativo é a dificuldade de se conectar com as personagens. Pelo menos eu, levei muito tempo para conseguir me relacionar com o narrador, no caso o próprio Garrard. E além dele, não há outros personagens relevantes para nos preocuparmos, até porque a maioria deles possuem nomes falsos ao ponto de serem denominados somente por uma letra.

Logicamente que a leitura nos permite sentir coisas, mas em sua grande maioria ódio: seja pelos pais de Garrard, pela pseudo instituição que quer lhe “curar”, pela igreja que condena sua verdade e também pelo dito amigo que lhe abusou. E apesar destes sentimentos serem bem válidos, levando em consideração a densidade do que é relatado, eu queria ter sentido coisas boas em relação ao autor, pois sentia que ele merecia. E mesmo tendo um desfecho libertador e vendo o rumo que a vida de Conley tomou, esse sentimento de superação não me foi relatado dentro da obra da forma que merecia, o que é uma pena ao meu ver.

Quando entramos no carro, ela disse:
– Vamos dar um passo de cada vez. Vamos tentar todas as opções.
Ficamos em silêncio durante toda a volta para casa.
P. 190

Recentemente “Boy Erased” foi adaptado para o cinema, com Nicole Kidman e Russell Crowe no elenco. Porém, de forma nada convencional – mas não surpreendente –, a distribuidora do filme, a Universal Pictures, cancelou o lançamento do mesmo sem aviso prévio ao público. Em contrapartida, a Intrínseca já tinha seus planos de publicação do livro em veiculação a estreia do filme lá em janeiro deste ano, e é por isso que o livro vem com uma luva baseada no pôster da adaptação cinematográfica.

A Universal, depois de muito barulho feito após o cancelamento do filme, deu uma resposta simples para o público, alegando que o filme não recebeu indicações nas principais premiações e que não teria retorno financeiro. Pode este ter sido o fato real do cancelamento? Sim. Porém, na situação atual que nosso país se encontra, precisamos estar atentos a casos como este, pois não é a primeira vez que obras cinematográficas com personagens de minoria recebem tratamento ou ruim ou nulo por parte das distribuidoras. No final do ano passado, perto das eleições, “O Ódio que Você Semeia” basicamente estreou somente em São Paulo, enquanto o aclamado “Com Amor, Simon” até hoje não recebeu lançamento em home-video. Pelo menos, a Universal Pictures manteve o plano de lançar o DVD de “Boy Erased”, e o mesmo já se encontra em pré-venda para 17/04.

– O que foi que ensinaram a você? Que Deus só quer que a gente fique sentado e O exalte o dia inteiro? Foda-se Deus, se isso for verdade. Eu prefiro ir para o Inferno com todas as pessoas interessantes.
P. 290

No mais, “Boy Erased: Uma Verdade Anulada” possui uma temática que precisa ser discutida, e claramente condenada. Já passou da hora da sociedade aceitar as diferenças e parar de usar de suas religiões e preconceitos para punir aqueles que divergem de sua hipotética figura ideal. Apesar da narrativa arrastada e com falhas, Garrard Conley consegue entregar um relato que é necessário, e mesmo que seu caso não seja o último nestes doentios moldes de pseudo cura, talvez sua história sirva para ajudar e prevenir que outras pessoas passem pelo que ele passou.

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Comentários
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2 comentários:

  1. Eu acabei vendo o filme já tem um tempinho e apesar das atuações incríveis de Nicole e Crowe(irreconhecível, diga-se de passagem), o filme é um pouco arrastado.
    Não, não é ruim de jeito nenhum. Mas há certos pontos que poderiam e mereciam serem mais detalhados!!
    Bem, recebi meu livro ontem e será uma das próximas leituras.
    Vou reclamar? Ah vou.rs leituras mais lentas dão um desânimo né?
    Mas lerei!
    Beijo

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  2. Tácio!
    Gosto muito de biografias e gostei da coragem que o autor teve em expor suas dificuldades em relação a família, a sua sexualidade e a crença religiosa, é preciso estar bem convicto de quem ele é hoje, para poder expor toda a dor pela qual passou e servir de exemplo para outras tantas pessoas que passam por algo semelhante.
    Já quero ter a oportunidade de conhecer a hitória de Garrard.
    Gostei da análise que fez.
    cheirinhos
    Rudy

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